Carlos Nougué
Em seu essencial El Reino de Dios – la
Iglesia y el orden político, o Padre Álvaro Calderón escreve sobre seu pai
o seguinte: “Como já começamos a fazer, tomaremos como guia para percorrer os
séculos a Rubén Calderón Bouchet, o qual não só possui em alto grau as raras
qualidades [de historiador] a que nos referimos, senão que, ademais, foi levado
ao ponto que buscamos por um processo diferente e de certo modo contrário ao
que nós seguimos. Nós transitávamos pelas alturas da especulação religiosa e
descemos, sem querê-lo nem esperá-lo, ao terreno político, descobrindo a continuidade
que há entre os dois. Calderón Bouchet sobrevoava as planícies dos fatos
políticos e viu-se necessitado – não por preconceito clerical, podemos assegurá-lo,
mas pela força da verdade – de alçar-se aos cumes da religião, descobrindo exatamente
o mesmo”. Neste pequeno trecho escrito pelo filho está cifrada a concepção
central do pai historiador: ou a história tem um fim transcendente, ou
simplesmente não passará de mero suceder-se de momentos ordenado ao nada.
É vasta a obra de Rubén Calderón Bouchet
(1918-2012): vai da Antiguidade até a atualidade, mas não como um suceder de
“momentos” livrescos numerosos, e sim como um organismo que se desenvolve.
Diga-se antes de tudo, transcrevendo a Antonio Caponnetto, que “se algo concorda com o magistério fecundo de Don Rubén é
a juntura de três palavras: a luz que tudo acende e fulgura porque tem sua
origem na única Luz da Luz, como se rezou para sempre em Niceia. O ágape, que
traz as reminiscências mais nobres da helenidade, mas o fruto mais alto do
banquete católico. E a cordialidade, que de coração procede, e que o Coração de
Jesus tem por última fonte, tal como ensinou Pio XII na Haurietis Aquas”.
Mas com isto ainda estamos nos preâmbulos. Porque, com efeito, diferentemente
da mais larga maioria dos historiadores – incluindo os mais renomados –, Don
Rubén escreveu seus muitos livros para mostrar que a disciplina da História tem
um limite grave e insuperável: não é capaz de explicar cabalmente por si seu
mesmo sujeito, seu mesmo objeto de estudo.
É que, como se não bastasse a razão para prová-lo, a própria realidade veio fazendo ruir todas as enteléquias imanentes que se foram dando à história desde o outono do Medievo: o domínio total da natureza pelo homem, como o queriam René Descartes e Francis Bacon; a liberdade e a democracia totais, como o queriam os iluministas e seus brutais agentes revolucionários; o fim do reino da necessidade, como o queriam Marx e seus sanguinários sequazes; conquanto alguns ainda insistam, nestes nossos tempos de tintas apocalípticas, em que o fim da história seja a eliminação de todos os freios às paixões, como o queriam Nietzsche, Freud, Marcuse, Foucault... Mas, se assim é, ou seja, se o fim da história não é imanente, não será senão transcendente – Deus e a completação do número dos que, por libérrima vontade Sua, O terão face a face por todo o sempre –; sendo porém transcendente, ou a disciplina da História se põe ao cabo sob as luzes da única disciplina que tem por sujeito o transcendente divino, a Teologia, ou será uma empresa frustrada.
Daí que, na vasta e orgânica obra de Rubén Calderón Bouchet, se destaque a trilogia composta por Formação da Cidade Cristã (que acabam de lançar entre nós as editoras Castela e Resistência Cultural), Apogeu da Cidade Cristã e Decadência da Cidade Cristã: com efeito, foi exatamente a Idade Média aquela que de longe melhor e mais se ordenou ao fim transcendente divino da história; e sua ruína, devida ao anseio burguês e régio de livrar-se da direção espiritual da Igreja para entregar-se sem jugo a suas mesmas paixões, implicou a deriva da maioria dos agentes humanos da história para os antípodas de seu fim último.
Link para compra da Formação da Cidade Cristã:
https://www.resistenciacultural.com.br/formacao-da-cidade-crista-de-ruben-calderon-bouchet
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