Carlos Nougué
O verbo ser predica-se de dois modos:
•
secundum se (como em Pedro é), para expressar o
ser em ato ou fato de ser;
•
ut adiacens, ou seja, quando se
predica em conjunção com o nome predicado (ou, em linguagem gramatical: com o
predicativo, como em Pedro é negro), para atribuir ao
sujeito da proposição o expresso por esse mesmo nome.
No
segundo modo, ademais, se se diz que o verbo ser não só é adjacente (por predicar-se
conjuntamente com o nome predicado), senão que é terceiro, é tão somente
porque constitui uma terceira dicção na proposição. Em outras palavras, o verbo
ser de cópula e o nome
que ele ajuda a predicar de um sujeito constituem um só e mesmo predicado, como
aliás não poderia deixar de ser: com efeito, as proposições não podem
dividir-se primeiramente senão em duas partes (sujeito e predicado).
Observação 1. Talvez
na esteira do Comentário do Cardeal Caetano ao Peri Hermeneias, os tomistas
costumam designar estes dois modos do verbo ser como, respectivamente, “de segundo
adjacente” e “de terceiro adjacente”. Mas, antes de tudo, Santo Tomás de Aquino
nunca usa a expressão “de segundo adjacente”. Com efeito, escreve o nosso
Doutor em seu Comentário
aos Analíticos Posteriores (l. II, lect. 1, n. 409): “Sicut autem in II Perihermeneias
dicitur, enunciatio dupliciter formatur. Uno quidem modo, ex nomine et verbo absque aliquo apposito, ut cum dicitur homo
est; alio modo, quando aliquid tertium adiacet, ut cum dicitur homo est albus” (destaques
nossos). Depois, insista-se, adjacente diz-se do verbo ser enquanto
adjacente ao nome predicado (ou predicativo, em linguagem gramatical), não enquanto
adjacente ao sujeito.
Observação 2. Em
Gramatica, tanto o verbo de cópula como o predicativo podem, por diferente ângulo, dizer-se núcleo de
predicado (o primeiro, verbal, pelo ângulo do
morfológico; o segundo, nominal, pelo ângulo do
significativo). Como porém se atribuem conjuntamente ao sujeito, não pode evitar-se a
conclusão direta de que se trata de um só predicado, digamos, “verbo-nominal”. Mais que isso,
todavia: atendendo a que, antes de tudo, o verbo de cópula realmente liga um nome
predicativo ao sujeito e, depois, a que o predicado de verbo de cópula +
predicativo efetivamente difere dos demais, devemos chamá-lo, segundo a mesma
tradição gramatical (e contra Evanildo Bechara), predicado nominal.
Observação 3. Voltando
ao âmbito da Lógica, diga-se portanto que se deve fazer a seguinte distinção
quanto às enunciações ou proposições:
•
Proposições com o verbo ser:
◊
absque apposito, ou seja,
proposições de ser em ato ou de existência;
◊ ut tertium adiacens, ou seja, proposições de terceiro adjacente.
(Trecho
de “A relação entre o verbo ser copulativo e o verbo ser com o
sentido de ‘ser em ato’, segundo Santo Tomás de Aquino”, in Estudos Tomistas – Opúsculos II.)