PERGUNTA DO ALUNO
Sobre
a 2ª aula, e a prova de Santo Anselmo, que sempre apreciei, embora reconhecendo
seu risco «idealista», pergunto se não se pode considerar, sem incomodar Santo
Tomás, como mais uma prova evidente de si, a criação da mente humana capaz da
evidência da existência de Deus, que demanda a existência de uma Mente (muito)
maior?
RESPOSTA DO PROFESSOR
Por partes.
1) Como diz S. Tomás, uma
proposição diz-se evidente quando o predicado ou é parte do sujeito, ou se
identifica com ele: este último é o caso de Deus
é (pouco mais ou menos = existe),
porque Deus é seu próprio ser. Mas o que a proposição expressa tem de ser, ele
mesmo, evidente quoad nos, quanto a
nós, para que nós tenhamos evidência simpliciter, em termos absolutos. Ora,
que Deus seja não é evidente quoad nos,
razão por que a mesma proposição Deus é,
se é evidente em si, tampouco o é quoad
nos.
2) E isso é assim porque, quanto a nós, a medida última da
evidência se dá do extramental para o
mental, e não do mental para o extramental (o que porém é verdadeiro quanto a Deus). Por isso, falando estritamente
e excluindo os primeiros princípios, nenhuma proposição nem nenhum raciocínio
ou argumento é de si absolutamente
evidente quoad nos. Considerar que o
possa ser é incorrer justamente no hiper-realismo do tipo de S. Anselmo e sua
prova da existência de Deus, o qual ao cabo, como dito em aula, é idealista.
Não se trata de “risco”, mas de ponto de chegada efetivo.
Observação
1. Se
a medida da evidência não pode dar-se do mental para o extramental, então um
raciocínio que quer evidente o que não o é quoad
nos não conclui corretamente. Logo, de crer erradamente que Deus é evidente
quanto a nós tampouco se pode concluir apodíctica ou cientificamente que haja
tal Mente. – E, repita-se e repita-se, se tal Mente fosse evidente, não haveria
ateus.
Observação
2.
Nenhuma crítica a S. Anselmo pode visar a desmerecê-lo como o grande teólogo e
como o grande santo que foi. Vide o
grande respeito que o mesmo S. Tomás nutria por ele e sua obra, apesar de
criticar-lhe sem melindres o hiper-realismo. Estamos no campo da ciência, não
no da devida simpatia ou do devido respeito.