quarta-feira, 1 de julho de 2015

Redução ao absurdo e prova (em resposta a pergunta de aluno do curso Por uma Filosofia Tomista)


PERGUNTA DO ALUNO

Professor, eu não entendi o porquê de não ser prova a redução por absurdo. Na matemática não a usamos? Se alguém disser: A verdade não existe. Outro responde: Esta sua afirmação é falsa ou verdadeira. Se falsa, prova-se (?) a verdade existe; se a afirmação for verdadeira, prova-se (?), está aí a única verdade, logo a verdade existe. Não podemos considerar esta argumentação como prova de que a verdade existe?

RESPOSTA DO PROFESSOR.

Importante pergunta. Respondo-lhe por partes.
1) Antes de tudo, o que é evidente não pode ser provado. Para entendê-lo, comece-se por dizer que o raciocínio pode cumprir duas funções.
a) Uma dessas duas funções é descobrir uma verdade desconhecida (e pois não evidente): S (o sujeito) é C (com a causa) e C (a causa) é P (com a propriedade), razão por que S é P. Trata-se da função inventiva do raciocínio.
b) A outra dessas duas funções é demonstrar uma verdade conhecida (mas não evidente): S é P porque S é C e C é P. Passa-se assim de uma verdade conhecida por simples atribuição à mesma verdade, mas conhecida por sua causa. Tem-se aqui a análise ou resolução da proposição em outras duas, com o que se manifesta a causa. Trata-se da função judicativa do raciocínio, em que se julga a verdade da atribuição.
2) Por outro ângulo, podemos ter raciocínios que provem algo segundo o modo propter quid, ou seja, da causa conhecida para o efeito; e podemos ter raciocínios segundo o modo quia, ou seja, do efeito para a causa desconhecida (que é como se prova a existência de Deus e da alma espiritual).
3) Ora, nada disto se dá na reductio ad absurdum (redução ao absurdo). Veja que, no caso citado por você, não se raciocina segundo nenhuma das duas funções indicadas no item 1, nem se prova a existência da verdade segundo nenhum dos modos indicados no item 2; mas tão somente se mostra que negar esta evidência (ou seja, que existe a verdade) implica incorrer em absurdo. Com isto, insista-se, não se prova a existência da verdade, mas tão somente se defende a verdade de uma objeção que, como mostramos, é absurda.
4) Com efeito, que A não é não A ao mesmo tempo nem pelo mesmo aspecto, que eu sou eu e tu és tu e que a verdade existe são evidentes, são autoevidentes, e por isso mesmo improváveis. (Note-se que “evidente” vem do lat. evĭdens, ēntis, “visível, aparente; claro, manifesto; digno de crédito”; part. pres. de evidĕor, ēris, ēri, “parecer inteiramente”.)
5) Chamar à reductio ad absurdum prova é pois expressar-se não propriamente.