RESPOSTAS DO PROFESSOR NO CORPO DO
E-MAIL DO ALUNO
1) Ainda
insisto no tema da analogia porque a leitura de "Ente e Essência",
por alguma razão, sempre me impele a isto.
RESPOSTA. Qualquer obra de Santo Tomás nos impele a isto, porque, com
efeito, a analogia é central na doutrina tomista. Mas insista-se: Santo Tomás
não nos deixou um tratado sistemático sobre a analogia; quem o fez foram
diversos tomistas, discrepando não raro uns dos outros; mais ainda, às vezes um
mesmo tomista mudou de perspectiva ao longo de seus estudos, como foi o caso de
Santiago Ramírez O.P. É deste último, aliás, a obra em que melhor se encontra o
estado da questão: a volumosa De analogia secundum doctrinam
aristotelico-thomisticam.
– De minha parte, repito: quanto à analogia, ainda tenteio, conquanto tenha já
algumas hipóteses ou, digamos, “pré-conclusões”, nas quais discrepo de algum
modo das soluções que já se deram a esta questão disputada. Não as devo porém
antecipar, até porque não sei se de fato as manterei.
2) Na
resposta anterior, o senhor expôs os diferentes tipos de analogia nesta ordem:
primeiro a "analogia de atribuição intrínseca", depois a
"de atribuição extrínseca", seguida da "de proporcionalidade
própria" e por último a "de proporcionalidade imprópria". Essa
ordem de exposição não me pareceu aleatória, diga-me se acerto: intuo que a
analogia de atribuição intrínseca esteja como que mais próxima da univocidade
(embora com ela não se confunda) enquanto que a analogia de proporcionalidade
imprópria esteja mais próxima da equivocidade propriamente dita (a propósito, é
certo dizer que analogia é espécie de equivocidade na qual existe razão para a
utilização do mesmo nome?). Então, naquela exposição, o senhor foi se afastando
da univocidade (sem dela partir) rumo a equivocidade (sem nela chegar)? (Não
sei se fui claro).
RESPOSTA. Não, a ordem não é aleatória. Está implícita às referidas
“pré-conclusões”. Por outro lado, não me parece conveniente sua escala das
diferentes espécies ou subespécies de analogia segundo certa proporcionalidade.
Com efeito, como dito no curso, é antes de tudo por analogia de atribuição
intrínseca que se devem pensar os diversos modos do ente, e, mais ainda, é antes
de tudo por ela que melhor conhecemos a Deus. Santo Tomás, partindo da
distinção geneticamente aristotélica entre esse
ut actus (ser como ato) e essentia ut
potentia (essência como potência), chegou, de início ainda com Aristóteles,
à analogia de atribuição intrínseca entre os modos secundários ou secundum quid do ente (o ente em
potência, o ente como verdadeiro, etc., o ente per accidens, os mesmos acidentes) e o modo principal do ente, ou
seja, a substância, e com isso pôde fundar a analogia de mesmo tipo entre os modos criados do ente e o Ato Puro que é Ser
– trata-se de sua doutrina da
participação. Ora, nada mais perto da equivocidade que a analogia entre
Deus e a criatura, e, no entanto, repita-se, trata-se aqui de analogia de
atribuição intrínseca. Diz Santo Tomás, em algumas partes de sua obra, não só
que entre a univocidade e a equivocidade há a analogia, senão que esta é uma
espécie de equivocidade; mas em outras partes pode ler-se que se trata de
univocidade imperfeita. Veja-se, aliás, o que diz o P. Calderón em seus Umbrales de la Filosofía: “Os análogos
são conceitos de universalidade imperfeita”. E parece-me que tal oscilação tem
sua razão de ser: com efeito, dependendo do ângulo que tomemos, havemos de
pender para um ou para outro extremo. Quanto ainda à escala exposta por você, talvez
se deva conceder apenas que a analogia de proporcionalidade imprópria se aproxima
ainda mais ou grandemente da equivocidade. – Insisto porém em que este é
assunto em que tão somente tenteio; e em que soluções como a de Mário Ferreira
dos Santos,* apesar de atenderem a
algo que parece óbvio, são antes simplistas, porque, com efeito, como diz o
Padre Penido em sua A Função da Analogia
em Teologia Dogmática, a própria
analogia é análoga ou analógica.
* O Brasileiro recorre, para explicar as diversas classes de analogia, à
distinção entre razões qualitativas e razões quantitativas.