quinta-feira, 25 de junho de 2015

A Posse da Verdade (em resposta a pergunta de aluno do curso Por uma Filosofia Tomista)


PERGUNTA DO ALUNO

A respeito da aula 08, e para checar se bem entendi: é correto dizer que a verdade se divide em 3 classes, segundo aquilo sobre o qual trata? As que versam sobre a essência serão verdades essenciais e necessárias, as que versam sobre propriedades (acidentes-próprios) serão acidentais e necessárias e as que versam sobre acidentes serão propriamente acidentais e contingentes (não necessárias), é isso? A primeira classe de verdade é acerca da quididade de algo, a segunda decorre da quididade de algo e a terceira independe da quididade e não a afeta. Resumo adequadamente? Ainda quanto a aula 8, o Sr. disse algo como: “dizer algo com verdade é distinto de estar de posse da verdade”. Por acaso “dizer algo com verdade” significa que o que se diz corresponde ao que se pensa, enquanto que "estar de posse da verdade" significa que há correspondência entre intelecto e a coisa? O primeiro é uma relação entre intelecto e discurso, o segundo entre intelecto e realidade? É essa a distinção?

RESPOSTA DO PROFESSOR


Divido-a.
a) Sim, são essas as três classes de verdade. Eu só burilaria esta parte: “a terceira independe da quididade e não a afeta”. De fato não a afeta; mas não independe propriamente da essência. Uma girafa pode ter vários tamanhos e pesos, pode ser jovem ou velha, etc.; mas não pode ser do tamanho de um gato nem pesar como um cão, nem sua vida pode normalmente ter a duração da de um inseto, etc. – e tudo isto é assim porque os mesmos acidentes têm a quididade por limites, digamos, externos. Outro exemplo, e por outro ângulo: como dito, os artefatos não têm quididade senão na mente do artista, e (como se verá na aula 21 ou 22) são formas acidentais. Assim, uma estátua é forma acidental de um pedaço de bronze; mas não pode ser forma acidental da água. Por quê? Porque o impede a quididade desta.    

b) Quanto a dizer algo com verdade e estar de posse da verdade, não é precisamente esta a distinção. Tento resumi-la. Quando olho uma folhagem verde e penso “folhagem verde”, penso algo com verdade porque o que penso corresponde à estimativa de si dada pela mesma folhagem verde; mas ainda não estou de posse da verdade porque ainda não submeti tal adequação ao tribunal do intelecto (sua segunda operação), no qual julgo se de fato se dá tal adequação, ou seja, se tal folhagem é efetivamente verde ou não o é. Neste tribunal se dá pois uma sentença, assim como, analogicamente, ainda que com verdade afirme ter direito a possuir algo disputado com outro, um homem só terá efetiva posse desse algo após sentença a seu favor de um tribunal competente. – Por isso diz Aristóteles que a verdade e a falsidade estão antes na mente que nas coisas.